PEQUENAS EMPRESAS GRANDES NEGÓCIOS, por Carlos Miranda – Está na hora de valorizar quem realmente se preocupa em criar valor para a sociedade e gerar oportunidades de desenvolvimento para o país

Nesse último mês, acompanhei as várias polêmicas envolvendo a legitimidade de uma empreendedora que, segundo consta, tem menos conteúdo e história empreendedora do que seu marketing pessoal tem propagado. Acompanhei também empreendedores com mais história e consistência que apresentaram posicionamentos bem combativos sobre essa exploração pessoal e financeira do “glamour” empreendedor que vem sendo construído ao longo dos últimos dez anos, pelo menos.

Quem me conhece sabe que sou uma das pessoas que mais combate esse “glamour” e essa elitização do empreendedorismo – por vezes, agimos como se a sociedade fosse separada entre  garbosos e corajosos empreendedores e  covardes assalariados. Na verdade, são esses “covardes assalariados” que ajudam a tangibilizar os sonhos de muitos empreendedores. Se nos aprofundarmos na história desses donos de negócios, veremos que a esmagadora maioria deles atribui o sucesso de suas empresas às equipes que formaram, ou que alguém (com menos exposição) formou para eles.

Essa ideia de que os empreendedores são as grandes estrelas, aliada à transformação dos mesmos em “rock stars”, traz dois resultados distintos. Por um lado, é verdade que inspira e ensina milhares de novos empreendedores. Por outro, cria várias noções distorcidas: a ideia de que empreender é só glamour; a percepção de que quem não empreende não tem valor; o surgimento de pessoas que nunca empreenderam “para valer”, mas que, por meio da autopromoção, se intitulam empreendedores, surfando nessa onda sem nenhum conteúdo ou história para contar; a desvalorização do trabalho em equipe; a falta de análise da falta de ética de muitos “rock stars”; a ideia de que sucesso é igual a dinheiro; e, finalmente, ausência do tema da responsabilidade social nessa construção de mitos do empreendedorismo.

Não quero dizer aqui que tudo o que foi feito até hoje no sentido de inspirar o empreendedorismo, mesmo com esses “efeitos colaterais”, não tenha sido de extrema importância na busca da consolidação do empreendedorismo no país. O que vejo –  e acho que essa última polêmica indica isso – é  que o empreendedorismo brasileiro começa a dar sinais de que está saindo da adolescência e prestes a entrar na vida adulta. E, nessa nova fase, não serão mais aceitas as “estrelas empreendedoras” sem consistência e sem histórias empreendedoras de fato.

Está na hora de todos os players que fomentam o empreendedorismo no Brasil incluírem em sua “agenda inspiracional” temas e valores que vão alem da riqueza dos empreendedores e que estão relacionados à riqueza gerada para a sociedade. É fundamental falar sobre o que os empreendedores fazem, de fato, para devolver para a sociedade parte de seu sucesso. Todos os empreendedores deveriam ser analisados de acordo com as seguintes perguntas:

1. Qual é o impacto, e o tamanho do impacto do negócio criado pelo empreendedor para o setor em que eu atua, na criação de valor para a sociedade e na geração de desenvolvimento?
2. Quais ações do negócio visam a geração de oportunidades, o desenvolvimento de pessoas, a sustentabilidade  e a igualdade social?
3. Qual o papel efetivo exercido pelo empreendedor em sua comunidade, visando a transformação social, o fomento do empreendedorismo e a melhoria do índice de desenvolvimento humano?

Enfim, chega de se inspirar ou usar como modelos apenas os empreendedores milionários, ou os pseudo-empreendedores que se beneficiam dessa bandeira tão nobre. Está na hora de valorizar quem realmente se preocupa em criar uma sociedade melhor.

Ver matéria original: https://revistapegn.globo.com/Colunistas/Carlos-Miranda/noticia/2016/09/chega-de-se-inspirar-em-pseudo-empreendedores.html