PEQUENAS EMPRESAS GRANDES NEGÓCIOS, por Carlos Miranda – Será que não está na hora de pararmos de idolatrar empreendedores apenas pelo seu sucesso financeiro, sem levar em conta os métodos usados para chegar lá?

Recentemente, muitas pessoas acompanharam o seriado que retratava a vida e “obra” do maior narcotraficante de todos os tempos, Pablo Escobar. Como eu me lembrava da maioria dos fatos da época, fiquei muito interessado em pesquisar mais e relembrar algumas coisas sobre a vida desse “fenômeno”, que só existiu graças a corrupção, ignorância e pobreza de muitos.

Apesar de repudiar todas as atrocidades feitas por ele e de ser radicalmente contra qualquer tipo de contravenção, não pude deixar de assistir a um outro seriado (melhor ainda) produzido pela TV colombiana, dessa vez com os olhos de alguém que gosta de observar e analisar o comportamento de empreendedores. Minha proposta era tentar esquecer um pouco as coisas terríveis feitas por esse homem e analisar as suas ações identificando acertos e erros, sob a ótica empreendedora.

Como tem sido demonstrado em todas as biografias, documentários e seriados, Pablo Escobar era uma pessoa dotada de uma inteligência analítica e estratégica acima da média, alem de possuir uma fantástica visão de oportunidades e ousadia (para não dizer “agressividade”) nos negócios.

Esses atributos geralmente indicam uma grande probabilidade de sucesso. No entanto, se não houver uma inteligência emocional agregada a essas competências, a probabilidade de fracasso será muito maior do que a de empreendedores que tenham uma inteligência apenas mediana, mas possuam uma inteligência emocional acentuada.

Confira abaixo os principais acertos e erros de Pablo Escobar que podem servir de lição para os nossos empreendedores.

ACERTOS

1. Conseguiu identificar uma necessidade de um mercado específico O reconhecimento de uma boa oportunidade – onde há um potencial mercado consumidor para a solução de um problema -, a percepção da escassez de um produto ou a identificação de um produto inovador é a base de qualquer empreendimento de sucesso.

2. Verificou a disposição dos membros desse mercado a pagarem pelo seu produto Uma solução ou produto que possa ser consumido por um mercado específico não é suficiente. O público deve estar disposto a pagar por esses produtos ou soluções, e os valores devem gerar lucro para a sua operação.

3. Influenciou toda a cadeia, da produção à distribuição Empreender é também expandir a sua área de influência. Desenvolver bons fornecedores e parceiros na distribuição e logística são cruciais em determinados tipos de operação. Nesse caso, Pablo Escobar estabeleceu essa influência, oferecendo sociedade a esses parceiros.

4. Entrou em um negócio que tinha as competências necessárias para gerenciar Embora ele estivesse entrando em um empreendimento novo, trazia competências anteriores adquiridas em negócios similares.

5. Anotava tudo O hábito de ter listas de tarefas a fazer evita a perda de foco e possibilita um melhor acompanhamento de suas atividades. Além disso, cria-se uma base histórica do seu negócio, facilitando o planejamento futuro.

6. Pensava em responsabilidade social No início de suas “atividades empresariais”, ele tinha uma preocupação legítima com a sua comunidade. Isso gerou uma grande admiração e suporte por parte da população local.

ERROS

1. Ficou arrogante Um dos primeiros sinais de potencial fracasso de um empreendedor é a arrogância oriunda do “sucesso”. Por conta dessa arrogância, empreendedores desrespeitam parceiros comerciais e perdem tempo e energia em projetos megalomaníacos. Ao longo do tempo, vão perdendo o respeito e confiança de todos os envolvidos.

2. Acreditou que sua influência e poder podiam tudo Ao conseguir aumentar a sua área de influência e ganhar muito dinheiro, passou a ter a sensação de poder influenciar tudo e todos. Parece algo fácil de entender, mas essa é uma das grandes armadilhas do sucesso para pessoas que não tem inteligência emocional: não suportar a frustração de ver algumas de suas empreitadas não se materializando em resultados.

3. Entrou em atividades que não conhecia Influenciado pelas arrogância e a sensação de poder tudo, entrou em uma área que não conhecia (a política), com a sensação de que conseguiria tudo. Não só não conseguiu, como foi expurgado dessa atividade e, como efeito colateral, perdeu o foco de seu negócio principal, alem de sofrer danos pessoais que impactaram no seu desempenho.

4. Afastou-se dos negócios para travar suas batalhas pessoais Por conta de sua vaidade e sensação de poder tudo, concentrou-se em batalhas pessoais que não agregavam nenhum valor para si nem para seu negócio. Quantos empreendedores não entram em disputas judiciais ou “brigas” com seus concorrentes apenas pelo prazer de “eliminar” os inimigos, que, na maioria dos casos nem representam ameaça real?

5. Não foi fiel com seus parceiros de negócio Se, no início da carreira, mantinha a sua palavra e respeitava os parceiros, mais tarde passou a adotar a política de só aumentar seus próprios ganhos, em detrimento aos de seus “parceiros comerciais”.

Sei que, à primeira vista,  analisarmos um narcotraficante como exemplo de empreendedorismo pode ser muito ruim. No entanto, escolhi esse exemplo propositadamente para que, alem das análises acima, façamos a seguinte reflexão. Quantas vezes admiramos e nos inspiramos em empreendedores pelo  simples fato de terem ganho muito dinheiro, sem nos preocuparmos com os meios que utilizaram para atingir esse sucesso?

Será que não está na hora da comunidade empreendedora e das entidades que fomentam o empreendedorismo pararem de idolatrar empreendedores apenas pelo seu sucesso financeiro? Será que não está na hora de passar a ser mais seletivo e criterioso quanto aos métodos utilizados para chegar lá? E quanto à maneira como tratam a comunidade e seus colaboradores? E, finalmente, quanto à quantidade de crimes “indiretos” que  alguns deles já cometeram? Quantos Pablo Escobar não existem ainda, travestidos de empreendedores e benfeitores?

Creio que essa seria uma grande contribuição que a comunidade empreendedora estaria dando para a melhoria da ética em  nosso país.As informações deste artigo refletem apenas as opiniões do autor, e não da Pequenas Empresas & Grandes Negócios.

Ver matéria original: https://revistapegn.globo.com/Colunistas/Carlos-Miranda/noticia/2016/01/etica-e-empreendedorismo.html